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Depois de um dia mau pode haver um céu estrelado. O meu reino.
Foi assim que me senti ontem. Voltei ao local onde o meu pai esteve internado e onde morreu. Voltei aquela sala. Acho que nunca falei da coragem extraordinária do meu irmão. O meu irmão trabalhava no serviço onde o meu pai passou mais tempo internado e onde morreu. Caraças, de cada vez que penso nisso acho que ninguém pode sobreviver de forma normal a este tipo de dor. Ele tratou do nosso pai, viu-o definhar e morrer. Mas pior do que isso é voltar todos os dias àquele local, olhar para aquela sala, vazia, cama feita. Aquela pequena cela de isolamento. Aqueles vidros onde os netos se penduravam. E ele faz isso diariamente. Ontem, enquanto fui ter com o meu irmão, senti uma estranha atracção aquele sítio e quando dei por mim já estava lá dentro, a olhar para todos os cantos, para todos os pormenores e a senti-lo ainda lá. Parecia que tinha sido ontem que lá tinha entrado pela última vez: naquele ritual de desinfectar as mãos, por luvas e máscarapa, dar um longo beijo, massajar-lhe as pernas, ler-lhe o jornal, contar as novidades do Henrique. E foi aí que senti uma dor tão fina que parecia que me tinham rebentado o coração. De dentro para fora.