Depois de um dia mau pode haver um céu estrelado. O meu reino.
por Princesa das estrelas
Ainda a propósito da morte com cancro e porque não quero usar como exemplo um mau exemplo. Eu não conhecia a Tereza Coelho e, hoje em conversa, disseram-me que, afinal ela não tinha cancro mas um tumor benigno e que a sua pneumonia em nada estava relacionada com cancro... Sendo assim, esqueçamos o caso da Tereza (apesar de alguns orgãos terem noticiado que ela tinha morrido de cancro). O que eu acho é que quando a pessoa morre de uma complicação do cancro tal não deve ser escamoteado. O meu pai, por exemplo, teve cancro da hipofaringe. Morreu de uma complicação da sua doença. Se tivesse sido atropelado ao atravessar a rua não seria de uma complicação do cancro. Mas como morreu dos efeitos da radioterapia. a verdade, pelo menos a minha verdade, é que morreu de uma complicação do cancro.
Autoria e outros dados (tags, etc)
por Princesa das estrelas
Ainda a propósito da morte com cancro e porque não quero usar como exemplo um mau exemplo. Eu não conhecia a Tereza Coelho e, hoje em conversa, disseram-me que, afinal ela não tinha cancro mas um tumor benigno e que a sua pneumonia em nada estava relacionada com cancro... Sendo assim, esqueçamos o caso da Tereza (apesar de alguns orgãos terem noticiado que ela tinha morrido de cancro). O que eu acho é que quando a pessoa morre de uma complicação do cancro tal não deve ser escamoteado. O meu pai, por exemplo, teve cancro da hipofaringe. Morreu de uma complicação da sua doença. Se tivesse sido atropelado ao atravessar a rua não seria de uma complicação do cancro. Mas como morreu dos efeitos da radioterapia. a verdade, pelo menos a minha verdade, é que morreu de uma complicação do cancro.
Autoria e outros dados (tags, etc)
por Princesa das estrelas
O cancro assusta-me, não o posso negar. Pensar que posso voltar a ficar doente a qualquer momento, assusta-me. Como já o disse várias vezes, tento (e acho que consigo) não viver presa nesse medo, não o deixo paralisar-me. Mas ele ronda-me, umas vezes com mais intensidade, outras com menos, mas ronda-me.
Ter cancro é horrível para além do que se possa imaginar. Porque estar doente nunca é fácil. Nem mesmo quando se tem uma gripe. E o cancro, apesar da evolução da medicina, ainda é uma doença muito mortal. Quando alguém nos diz que temos cancro conseguimos cheirar o odor da morte. Eu senti-o claramente. E o cancro é ainda mais horrível porque as armas que existem para o combater nos definham ao ponto de, por vezes, serem, elas próprias, causadoras de morte. Eu não posso falar da morte com conhecimento de causa, porque continuo aqui. Mas sei bem o que a quimioterapia e a radioterapia nos fazem. Sei bem até onde desci, na minha dignidade, sei que dores passei, o desespero que vivi durante os tratamentos e nos meses que se seguiram.
Mas fiz tudo o que me mandaram e voltaria a fazê-lo de novo, se o tempo voltasse atrás. Porque a mim nunca me mentiram, nunca me deram falsas esperanças, nunca me pintaram cenários cor-de-rosa, nunca me deram hipóteses para além das viáveis.
Os médics não são deuses, não são donos da poção da vida, não nos podem devolver o que perdemos com a doença. Mas os médicos, e muitos parecem esquecer isso, são pessoas e, como tal, têm o direito e a obrigação de nos tratar com dignidade, de nos permitir essa dignidade e, sobretudo, de deixarem que caia sobre nós o poder de decidir o que fazer quando não há nada mais a fazer.
Eu sujeitei-me a seis ciclos de quimioterapia e a 25 tratamentos de radioterapia porque adoro a minha família. porque tinha um bebé de oito meses à minha espera, porque tinha um companheiro fantástico do meu lado. Mas também porque sempre tive a noção exacta da minha doença, da sua extensão, das suas implicações, dos passos que podia tomar, dos riscos que estava a correr. E isto fez toda a diferença. Os meus médicos nunca me mentiram. Um houve, até, que foi excessivamente sincero o que, na altura, me deixou de rastos e me fez odiá-lo por várias semanas. Mas, apesar de saber que o cenário poderia complicar-se a qualquer momento e muito rapidamente, os meus médicos sempre me disseram que o objectivo de tudo era a cura.
Essa honestidade deu-me a força para enfrentar as dificuldades com dignidade.
Se na altura me tivessem dito que o tumor já estava muito metastisado e que dificilmente haveria cura, talvez eu tivesse tomado decisões diferentes das que tomei. Talvez não. Mas sei que seria eu a decidir, a colocar tudo na balança e a decidir o que fazer com o tempo que me restasse. É assim que quero fazer se um dia a doença voltar: decidir o que fazer.
Não consigo perceber como há médicos que mentem, omitem grosseiramente informação aos seus pacientes, os deixam acreditar numa coisa que não é verdade e, sobretudo, os submetem a tratamentos, a sofrimentos desumanos sem qualquer tipo de valor acrescentado, fazendo apenas com que o pouco tempo que lhes resta seja passado em sofrimento e em degradação. Morrer aos poucos não deve ser agradável, viver com essa faca sobre a cabeça, de que o fim está muito muito próximo não é pêra doce, mas viver tudo isso assistindo a uma degradação progressiva do nosso corpo causada pelos tratamentos que nada fazem para além de nos deixar mais moribudos, parece-me um crime.
Porque a nós, doentes oncológicos, a dignidade é, por vezes, a única coisa que no resta.
Autoria e outros dados (tags, etc)
por Princesa das estrelas
O cancro assusta-me, não o posso negar. Pensar que posso voltar a ficar doente a qualquer momento, assusta-me. Como já o disse várias vezes, tento (e acho que consigo) não viver presa nesse medo, não o deixo paralisar-me. Mas ele ronda-me, umas vezes com mais intensidade, outras com menos, mas ronda-me.
Ter cancro é horrível para além do que se possa imaginar. Porque estar doente nunca é fácil. Nem mesmo quando se tem uma gripe. E o cancro, apesar da evolução da medicina, ainda é uma doença muito mortal. Quando alguém nos diz que temos cancro conseguimos cheirar o odor da morte. Eu senti-o claramente. E o cancro é ainda mais horrível porque as armas que existem para o combater nos definham ao ponto de, por vezes, serem, elas próprias, causadoras de morte. Eu não posso falar da morte com conhecimento de causa, porque continuo aqui. Mas sei bem o que a quimioterapia e a radioterapia nos fazem. Sei bem até onde desci, na minha dignidade, sei que dores passei, o desespero que vivi durante os tratamentos e nos meses que se seguiram.
Mas fiz tudo o que me mandaram e voltaria a fazê-lo de novo, se o tempo voltasse atrás. Porque a mim nunca me mentiram, nunca me deram falsas esperanças, nunca me pintaram cenários cor-de-rosa, nunca me deram hipóteses para além das viáveis.
Os médics não são deuses, não são donos da poção da vida, não nos podem devolver o que perdemos com a doença. Mas os médicos, e muitos parecem esquecer isso, são pessoas e, como tal, têm o direito e a obrigação de nos tratar com dignidade, de nos permitir essa dignidade e, sobretudo, de deixarem que caia sobre nós o poder de decidir o que fazer quando não há nada mais a fazer.
Eu sujeitei-me a seis ciclos de quimioterapia e a 25 tratamentos de radioterapia porque adoro a minha família. porque tinha um bebé de oito meses à minha espera, porque tinha um companheiro fantástico do meu lado. Mas também porque sempre tive a noção exacta da minha doença, da sua extensão, das suas implicações, dos passos que podia tomar, dos riscos que estava a correr. E isto fez toda a diferença. Os meus médicos nunca me mentiram. Um houve, até, que foi excessivamente sincero o que, na altura, me deixou de rastos e me fez odiá-lo por várias semanas. Mas, apesar de saber que o cenário poderia complicar-se a qualquer momento e muito rapidamente, os meus médicos sempre me disseram que o objectivo de tudo era a cura.
Essa honestidade deu-me a força para enfrentar as dificuldades com dignidade.
Se na altura me tivessem dito que o tumor já estava muito metastisado e que dificilmente haveria cura, talvez eu tivesse tomado decisões diferentes das que tomei. Talvez não. Mas sei que seria eu a decidir, a colocar tudo na balança e a decidir o que fazer com o tempo que me restasse. É assim que quero fazer se um dia a doença voltar: decidir o que fazer.
Não consigo perceber como há médicos que mentem, omitem grosseiramente informação aos seus pacientes, os deixam acreditar numa coisa que não é verdade e, sobretudo, os submetem a tratamentos, a sofrimentos desumanos sem qualquer tipo de valor acrescentado, fazendo apenas com que o pouco tempo que lhes resta seja passado em sofrimento e em degradação. Morrer aos poucos não deve ser agradável, viver com essa faca sobre a cabeça, de que o fim está muito muito próximo não é pêra doce, mas viver tudo isso assistindo a uma degradação progressiva do nosso corpo causada pelos tratamentos que nada fazem para além de nos deixar mais moribudos, parece-me um crime.
Porque a nós, doentes oncológicos, a dignidade é, por vezes, a única coisa que no resta.
Autoria e outros dados (tags, etc)