Depois de um dia mau pode haver um céu estrelado. O meu reino.
por Princesa das estrelas
Sinto que me faz falta uma daquelas aulas de preparação para o parto, onde ficava uns 15 minutos deitadinha, de olhos fechados, apenas concentrada na minha respiração. Inspira, expira, inspira, expira... é que as coisas não estão muito fáceis aqui para estas bandas. Hoje, pela primeira vez em algum tempo, senti-me fisicamente esgotada, a tremer, com uma dor de cabeça daquelas em que só nos apetece fechar os olhos deitada num quarto escuro. Mas tal não foi possível. Hoje foi o segundo de doze dias em que vou estar sozinha com o Henrique. O pai partiu ontem depois do almoço em direcção a Bragança, no encalce do Dr. Portas, por esse Portugal fora. E nós temos de nos amanhar os dois. Uns dias melhor, outros pior... já sabemos como é. Mas digamos que não começou bem. A tarde de ontem foi assim para o horrível. E agora, aqui sentada no sofá, de computador no colo e a ver televisão, apercebo-me de que a culpa foi tanto dele como minha. A semana foi particularmente difícil no trabalho, eu ando nervosa, ansiosa, cansada ... logo, com pouca paciência. E os miúdos, já se sabe, têm uns radares do caraças. Aliás, o meu podia trabalhar no aeroporto... sentiu que eu não andava bem e vai daí a infernizar a cabeça da mãe. Ontem, depois de dois chichis pelas pernas abaixo, passei-me, na verdadeira acepção da palavra, e preguei-lhe duas grandes palmadas no rabo...senti-me um traste.
Hoje, depois da ida à feira para frutas e legumes, e do almoço, rumámos à Terra Pura (sugestão de uma amiga) e comprámos um óleo essencial de alfazema e um spary de alfazema natural para borrifar a almofada. É que esta mãe está mesmo a precisar de relaxar... Cá andei, a queimar alfazema pela casa. Acabei por descobrir uma espuma de banho de alfazema perdida aqui em casa e toca de enfiar-me com o puto dentro da banheira... resultou: ele dorme o sono dos justos e eu, bem, eu estou um bocadinho mais calma e com menos vontade de chorar de cansaço.
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por Princesa das estrelas
Foi um choque. Senti um aperto tão grande há medida que o meu marido me ia contando o que tinha acontecido que só pensava o que faria numa situação semelhante. Um pai esquecera-se do seu filho de nove meses no carro e, três horas depois, quando regressou alertado pela mãe, o bebé tinha morrido. Fiquei horrorizada, angustiada... mesmo agora, com a distância de dois dias, não consigo parar de tremer quando penso no que aconteceu.
E eu não conseguia parar de pensar. Não conseguia desviar de mim o terrível pensamento que aquilo poderia muito bem ter acontecido comigo. Ou com o meu marido.
É possível amar um filho e esquecer-se dele? Era mais ou menos este o excelente título da nótícia do Público. A minha resposta é sim e daí esta angústia, esta incredulidade. Eu acho que uma coisa destas pode acontecer. E isso assusta-me. Todos pensamos que somos bons pais e que nunca nos esquecemos deles e que eles estão sempre em primeiro lugar em tudo o que fazemos ou pensamos... mas basta termos a coragem de olhar bem dentro de nós e conseguimos ver que uma tragédia destas podia bater à nossa porta. À minha, pelo menos, podia.
Vivemos tão obcecados com o trabalho, com as reuniões, com as pequenas tragédias do universo que nos rodeia quando estamos a trabalhar que muitas vezes nos esquecemos do essencial: a festa de anos, a peça de teatro do colégio, levantar isto, deixar aquilo. Bem sei que esquecer-se de um bebé não é a mesma coisa que esquecer um papel no carro. Mas se ele estiver a dormir e nós estivermos atrasados para aquela reunião.... não sei. Quantas crianças morrerm afogadas no instante em que um dos pais desvia olhar? E quantas caem da varanda? E quantas bebem produtos tóxicos? Esses pais são julgados na praça pública?
Não consigo deixar de pensar que a vida daquela família está irremediavelmente perdida, que aquele homem nunca terá uma noite de descanso, que a imagem do seu bebé morto no banco traseiro do carro nunca deixará de o perseguir, que aquela mãe, por mais que tente, nunca conseguirá perdoar.
E sinto-me triste que vivamos num mundo assim, que nos asfixia.
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