Depois de um dia mau pode haver um céu estrelado. O meu reino.
por Princesa das estrelas
Faz hoje um ano que o meu pai morreu. Não posso dizer que tenha sido sem aviso, ele estava doente há dois anos, vivia num grande calvário e, talvez por isso, tenha decidido desistir. O seu enorme coração já não suportava tanta dor e tanta tristeza. E assim, apesar da alegria de ver os netos, apesar da minha mãe, de mim e do meu irmão, ele decidiu que não queria viver mais.
E quem me conhece sabe que sou a última pessoa a criticar ou a condenar o meu pai. O que ele vivia, sendo viver, ja não era quase nada. Era coisa pouca para um homem tão grande e tão generoso.
Faz hoje precisamente um ano que soube o que era perder um bocadinho de mim. E, fechando os olhos, lembro-me de quase tudo o que aconteceu nesse dia.
Todos tínhamos consciência que o meu pai nos estava a escapar por entre os dedos; ele já tinha desisitido há alguns dias; lembro-me do telefonema para me ir despedir dele; recordo-me perfeitamente dos minutos que estivemos a sós... ele já inconscinete, sereno, tranquilo. O coração a bater cada vez mais devagar; sei exactamente o que lhe disse, os beijos que lhe dei, as saudades que comecei a sentir logo naquele instante... E depois saí, fui a casa escolher uma roupa, a mais bonita, tudo a condizer (o meu pai adorava que eu lhe escolhesse a roupa)... e depois o telefonema do meu irmão, a chegada ao hospital, o olhar para ele já sem vida, a tristeza da minha mãe, o desespero do meu irmão. E quando olhei para o meu irmão, roupa nos braços para vestir o meu pai com um coleg de trabalho, soube que não o podia deixar com um estranho a fazer a mais penosa das suas tarefas: aquele não era um morto, era o nosso pai. E ainda não sei como, contrariei todas as minhas crenças e entrei naquela sala para o vestir, num ritual muito ambíguo: triste, muito triste mas, simultaneamente, com algum orgulho por sermos nós, naquele momento, a tratar dele.
E depois foi tudo muito rápido. Um ano a voar, o primeiro aniversário do mano sem ele, o primeiro Natal, o meu primeiro aniversário, o dele, o do Henrique, o da mãe, o dia do pai....
E a cada dia que passa sinto mais saudades dele...
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